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Cigarrinha-do-milho: o que aprendemos com o monitoramento populacional

A semeadura da safra 2023/24 de milho se aproxima e, com ela, um dos maiores temores dos produtores: a cigarrinha-do-milho (Dalbulus maidis). Em locais mais quentes da região Sul, como o noroeste do Rio Grande do Sul e oeste de Santa Catarina, já se observam áreas semeadas com a cultura, bem como níveis populacionais alarmantes de D. maidis. Isso explica-se, em parte, pelo inverno ameno com pouca ocorrência de geadas, que possibilitou maior sobrevivência de milho voluntário nas lavouras. Essas plantas constituem uma ponte verde para a praga durante a entressafra, além de hospedar os patógenos causadores do complexo de enfezamentos (espiroplasma, fitoplasma e vírus-da-risca).

Contudo, esse alto nível populacional de cigarrinha-do-milho já no início da safra não pode ser atribuído apenas à sobrevivência local da praga. Como vimos na semana passada (Cigarrinha-do-milho no Brasil: como explicar o aumento na ocorrência?), esse inseto possui a capacidade de migrar por longas distâncias, movendo-se de lavouras de milho em final de ciclo para outras recém-semeadas. Isso possibilita ampla oferta de alimento para a praga, já que no Brasil cultivam-se duas a três safras de milho por ano. Não por acaso, o aumento nos surtos de D. maidis a partir de 2015 coincide com o aumento na área cultivada com milho de segunda safra, principalmente na região Centro-Oeste.

Figura 1. Sintomas típicos do enfezamento do milho.

Essa hipótese tem sido atestada pelo monitoramento populacional da praga, onde se observa o aparecimento de insetos já portando os patógenos logo após a germinação da cultura, mesmo em áreas onde não se cultivava milho há vários anos (OLIVEIRA et al. 2002). À medida que a safra de verão progride, os níveis populacionais de D. maidis aumentam exponencialmente, assim como a incidência da doença. Oliveira e Sabato (2018) chamaram esse fenômeno de “efeito de concentração”, onde a maturação e colheita das primeiras lavouras de milho direcionam as populações do inseto para as áreas semeadas mais tardiamente. Ou seja, quanto mais tarde a lavoura for semeada, maiores serão as chances de sofrer danos pelo ataque de cigarrinha-do-milho.

Esse efeito pode ser observado no gráfico de flutuação populacional da praga, obtido a partir de dados de 56 municípios do Rio Grande do Sul, coletados na safra 2021/22 (Figura 2). Verifica-se claramente que o pico de D. maidis ocorre entre janeiro e fevereiro e perdura até o final do verão, caindo drasticamente após maio e praticamente desaparecendo durante o inverno. Assim que a safra subsequente se inicia, os níveis populacionais crescem novamente, como resultado da sobrevivência local de insetos, mas também de fluxos migratórios originários de locais mais quentes.

Figura 2. Número médio de adultos de Dalbulus maidis coletados semanalmente em 56 municípios do Rio Grande do Sul.

Quando esses mesmos dados são analisados separadamente para cada município, verifica-se que a maior pressão populacional de cigarrinha-do-milho ocorre no noroeste do estado, com destaque para os municípios de Novo Machado e Salvador das Missões (Figura 3). Nessa região, a proximidade com o rio Uruguai evita a ocorrência de geadas tardias e gera um microclima ideal para a semeadura precoce de milho, bem como para a ocorrência de D. maidis. Portanto, caso exista de fato um fluxo migratório de cigarrinha-do-milho sustentando a população da praga no estado, essa região é a porta de entrada mais provável.

Figura 3. Número médio de adultos de Dalbulus maidis coletados semanalmente em 56 municípios do Rio Grande do Sul (dados isolados por município).

De toda forma, a eliminação de plantas voluntárias de milho continua sendo uma das principais estratégias para o manejo integrado de D. maidis, visando diminuir as chances de sobrevivência da praga durante a entressafra. Recomenda-se também reduzir a janela de semeadura da cultura e evitar o cultivo escalonado: assim, todas as áreas de milho em uma escala local atingirão o final de ciclo de forma simultânea ou muito próximas, evitando o efeito de concentração citado anteriormente. Tratam-se de medidas preventivas, cujo custo financeiro para o produtor é menor do que controlar o problema quando este já está estabelecido.